Maria Isabel Adami Carvalho Potenza
Questão de Consciência
Data: 16/02/2023
Edição: 87
Certa vez, aproximou-se de Jesus um jovem rico, a perguntar-lhe que deveria fazer para alcançar a vida eterna. O Senhor apontou-lhe, então, o caminho da renúncia. E ele, não suportando a palavra, retirou-se triste e abatido, porque era dono de muitos bens. A história repete-se nos séculos. Quantos preferem a largueza do caminho fácil, a ter de renunciar ao supérfluo, seja em coisas, objetos, empreendimentos, propriedades, dinheiro ou luxo. Bem desejariam achar a Cristo para, atendendo à Sua Lei, sentir a paz, a alegria e a doçura, que d’ELE promanam. Mas, para aqueles que não têm coragem de renunciar, mais fortes que os apelos da consciência são os atrativos efêmeros do mundo. Todos nós temos algo a renunciar, porque nenhum caminho foi aberto em planície preparada. Há pedras, há espinheiros, há feras escondidas, há venenos mortais em forma de água e mel.
No íntimo da consciência, cada um conhece os tropeços de sua vida: sabe o que existe de mau, ilícito, injusto e pecaminoso.
Se, porém, nos aventurássemos a um exame coletivo de consciência, para meter o dedo nas chagas e mazelas públicas, sentiríamos também o peso da responsabilidade pessoal nas deformidades morais de nossa sociedade. Há culpa em todas as classes; há erros em todos os setores, porque, pessoalmente, cada um de nós se nega a renunciar e a endireitar as veredas tortuosas. O mais doloroso é que talvez ninguém se julgue responsável; e daí, todos se acomodam a situações que são verdadeira traição à mensagem de Cristo. Há hospitais de indigentes lutando em hospitais sem condições dignas, por falta de recursos. Há gente nossa, enferma e faminta, amontoada por quantas Alamedas “Ezequiel Dias” existam por aí. Há recém-nascidos abandonados nos lotes vagos, ou inocentes meninos, feridos na sua dignidade de pessoas humanas, revirando nossas latas de lixo em busca de restos de alimento. E a culpa, não é de ninguém? Ninguém se sente culpado?!
Se fôssemos a Cristo, como o jovem rico, indagar que deveríamos fazer agora para merecer o reino dos céus, Ele talvez nos dissesse: “Renunciai ao vosso egoísmo. Renunciai à vossa indiferença. Renunciai à vossa comodidade. Dai amor aos enfermos e aos pobres, se quiserdes merecer o Meu Amor. Ensinai à mulher a grandeza da maternidade. Tirai as criancinhas das sarjetas. Amparai a velhice abandonada”. Que nos poderia dizer o Mestre, senão repetir a mesma lição de renúncia, que, em diversas modalidades, repetia e apregoava aos homens do seu tempo, símbolo dos homens de todos os tempos?
Renunciar é questão de consciência. Mas, renunciar a quê? Ao negócio escuso, que rende milhões, embora ao pobre custe vigílias sofridas, suor, lágrimas e a fome insaciada das crianças, que estiolam, não tanto à míngua de pão, roupa e remédio, mas ao egoísmo causticante dos ambiciosos, que nada entendem de ternura, carinho e amor. Renunciar aos lucros abusivos, que enchem os cofres palacianos e bancários, claramente: “Quão difícil é en-trar no reino de Deus os que confiam no dinheiro!”
Renunciar aos empreendimentos condenados pela moral, muitas vezes velados no silêncio das coisas escondidas e apenas vistos pelo olho dAquele que sonda rins e coração. Quem não tem algo a renunciar? O comerciante, que rouba nos preços; os jovens, que se abismam nos desvios da impudicícia, que lhes é exacerbada por culpa nossa, que não reagimos contra o cinema imoral, contra a vergonhosa avalanche das publicações torpes, contra os baixos espetáculos e maus ambientes; todos têm a que renunciar: os pais, que afrouxam a disciplina no lar, à desculpa da liberalidade das modernas técnicas pedagógicas; as moças, que esqueceram a palavra sagrada do Livro Santo: “Graça sobre graça é a mulher santa e cheia de pudor!”. Os rapazes, que profanam a santidade do amor em namoros e noivados, que não desejariam para sua cândida irmãzinha; os empresários de espetáculos públicos ditos de arte, mas na realidade, quantas vezes, deprimente exploração do mal.
Quantos e em quantas formas devem renunciar!
E nem se vá dizer que esta é uma mensagem ditada por aquilo que se convencionou chamar de “puritanismo”, para desculpar o que não tem desculpa.
“Quão estreita é a porta e quão apertado é o caminho!
Se alguém quiser vir atrás de Mim, renuncie-se a si mesmo e então siga-me!”